segunda-feira, 22 de junho de 2009

Em defesa da CUT classista e de luta!

Contribuição da Corrente Sindical da Esquerda Marxista ao debate do 11ª Cecut


Crise mundial e solidariedade de classe

A classe trabalhadora está apreensiva. Governos e economistas a soldo do capital querem fazer crer que o pior da crise econômica já passou. Apontam o milagre,mas não mostram os sinais. A própria ONU reconheceu que a contração da economia mundial será de 2,6% este ano e que até 100 milhões de trabalhadores podem ficar desempregados em conseqüência da crise mundial. Os dados indicam que não se trata de uma simples crise financeira, mas de uma crise de superprodução de capital, bem mais profunda e sem perspectiva de retomada de crescimento a curto prazo.
O governo estadunidense tomou várias medidas para diminuir os efeitos da crise, como injeções de capital, empréstimos, estatizações parciais e a compra de “títulos podres”, e ainda assim, o desemprego nos EUA atinge hoje 9,4% da população do país. Além disso, as expectativas em relação à mudança que o governo Obama poderia representar começam a se desmanchar, pois a transferência de trilhões de dólares para resgatar as instituições financeiras deixa claro que o Estado americano presta seus serviços a uma oligarquia financeira, que tem no Estado seu salvador e cúmplice. As medidas recentes de estabelecer controles sobre as operações financeiras – sobre aquilo que Obama chamou de “cultura da irresponsabilidade” – querem ignorar as características essenciais do capitalismo. A expansão do crédito, e a especulação que a acompanha, é uma necessidade para a formação e para o desenvolvimento do mercado mundial, e não pode ser restringida. A “cultura da irresponsabilidade” é a pedra de toque do Capital: um sistema baseado na competição anárquica pelo lucro entre capitalistas individuais. Em essência, a crise econômica, a crise alimentícia e a crise ambiental são expressões das contradições geradas pelo capitalismo, das relações que permitem a apropriação por parte de uma minoria da riqueza produzida por todos.
Evidentemente, dada a complexidade da economia mundial, há oscilações nos dados e variações do impacto da crise entre países e setores econômicos. Mas o resultado geral é trágico para os trabalhadores e trabalhadoras de todo mundo: quer pela retração econômica, como nos países europeus, quer pelo crescimento insuficiente, como na China. Os fantasmas do desemprego e da deterioração das condições de vida tiram o sono da classe trabalhadora.
Na América Latina, a crise vai se instalando na queda dos preços das commodities (produtos agrícolas e minerais que constituem o grosso das exportações dos países da região), na diminuição das remessas de dinheiro enviadas por trabalhadores emigrados na Europa, EUA e Japão, e da retração dos investimentos estrangeiros. Essa situação tende a recrudescer a luta de classes e os conflitos contra os interesses imperialistas estabelecidos no subcontinente das “veias abertas”.
Se por um lado a crise econômica mundial traz conseqüências desastrosas para classe trabalhadora, por outro lado, semeia condições para uma forte contestação das relações capitalistas de produção. É nesse momento que o artigo segundo dos estatutos da CUT ganha uma atualidade inesperada: a Central deve lutar pela “transformação da sociedade brasileira em direção à democracia e ao socialismo”.
A luta pelo socialismo deve incluir a solidariedade com nossos irmãos de classe nos países latino-americanos. Os haitianos, por exemplo, merecem essa solidariedade, que pode se expressar de várias formas. Mas não pelo auxílio a uma intervenção armada que procura garantir as bases da exploração capitalista na ilha, as mesmas que geraram a calamidade social que vitima a primeira república negra da história. Nesse sentido, a CUT deve exigir a retirada das tropas brasileiras do Haiti. Da mesma forma, as tensões no Estado Venezuelano podem se ampliar, em decorrência da queda dos preços do petróleo. O processo revolucionário porque passa aquele país tende a encontrar dificuldades redobradas, enfrentando a resistência conjunta das elites venezuelanas, dos burocratas e reformistas instalados nas estruturas do Estado e das pressões imperialistas. A CUT deve estar pronta a prestar solidariedade e dar seu apoio à Revolução Venezuelana contra agressões imperialistas, defendendo as conquistas sociais geradas para a classe trabalhadora daquele país.

A realidade nacional e a atuação da CUT

O governo brasileiro segue a cartilha estabelecida mundialmente. Seus representantes lembram a todo o instante a solidez da economia brasileira e recentemente comemoraram a queda de 0,8% do PIB no primeiro trimestre de 2009, menor do que a prevista. Isso seria um indício da recuperação da economia. Mas esse dado deve ser olhado com mais atenção. A queda do PIB foi refreada pelo aumento do consumo das famílias (1,3%) – em parte estimulada pela queda do IPI e pelo aumento do crédito nos bancos estatais -, e do próprio governo (2,7%). Mas é improvável que esta situação possa ser sustentada a longo prazo por vários fatores: há limites para o endividamento do Estado e das famílias; a crise tende a impedir o aumento da renda do trabalhador; e as medidas de isenção fiscal geram queda na arrecadação do Estado. Já a exportação brasileira, sustentada pelas commodities, puxou o PIB para baixo, com queda de 15,2%. E o que é mais significativo e preocupante: a queda de 14% do investimento do setor privado. Na é a toa que a indústria, setor fundamental na produção da mais valia explorada pelos capitalistas, teve uma queda na produção de 9,3% em relação ao mesmo período de 2008. Hoje, o desemprego atinge 8,9% da população das principais regiões metropolitanas do país. No mês de maio, só a indústria paulista fechou 3.500 postos de trabalho. As dificuldades enfrentadas pelo PAC podem ser associadas com essa situação. Só 10% das obras previstas foram realizadas, principalmente porque o setor privado, “parceiro” de negócio do governo federal, não está cumprindo “sua parte” com investimentos produtivos.
Não é o papel de um autêntico governo dos trabalhadores e para os trabalhadores vender ilusões sobre o capitalismo. O PT e CUT surgiram da ascensão e da organização da classe trabalhadora brasileira em luta contra o regime militar e o arrocho provocado pela exploração capitalista nas décadas de 70 e 80. Hoje, no entanto, o governo Lula mantêm a política de superávit fiscal e da LRF; aplica a desoneração de tributos, pondo em risco a manutenção dos serviços sociais; cede recursos para salvaguardar os negócios dos capitalistas; e edita medidas provisórias para resgatar instituições financeiras. É lógico que o governo não pode ter dois senhores ao mesmo tempo. A CUT deve lutar para o rompimento da coalizão do governo Lula com os capitalistas. Ao mesmo tempo, a CUT deve exigir medidas em defesa da classe trabalhadora como: a aprovação de uma medida provisória para impedir as demissões; a ratificação da convenção 158 da OIT, contra a demissão imotivada; a re-estatização das empresas privatizadas no último período, como a Vale do Rio Doce, Embraer e CSN, para que os recursos dessas empresas possam ser utilizados no combate aos efeitos da crise econômica; a anulação dos leilões do petróleo e a defesa da camada pré-sal, postos sobre o monopólio de uma Petrobrás 100% estatal; a realização imediata da Reforma Agrária, dando terras para quem nela vive e trabalha; e a estatização de fábricas quebradas e ocupadas pelos trabalhadores, postas sob controle operário, para garantir a manutenção da produção e dos empregos. Relacionada a essa última medida, a CUT deve dar todo o apoio à luta da Flaskô, em Sumaré-SP, fábrica ocupada que luta por sua estatização, e à campanha pelo fim da intervenção federal e pela estatização da Cipla/Interfibra, de Joinville-SC, empresa retirada do controle dos trabalhadores pelo INSS em 2007.

Eleições estaduais: para onde vai a direção do PT?

O governo peemedebista de Roberto Requião se caracterizou por colocar em prática alguns princípios reformistas, pondo freios ao capital puramente especulativo amplamente favorecido no governo que o antecedeu, estabelecendo um novo ponto de equilíbrio na repartição dos lucros do capital, mais favorável ao setor “produtivo” do estado. A disputa pelo controle do porto, das rodovias, da ferroeste, da Copel e da Sanepar foram ações no sentido de impor esses limites, sem, no entanto, ameaçar a ordem de expropriação do Capital, demonstrada na questão dos pedágios, das políticas de isenção fiscal e da defesa da Lei de Responsabilidade Fiscal. Pelo contrário, o governo Requião salvaguardou essa ordem, acomodando os conflitos de classes, procurando atender e atrair para sua gestão setores da classe trabalhadora confrontados pela política lernista. Programas assistencialistas como o Leite para Crianças, a recuperação parcial do salário do funcionalismo público, medidas para atender reivindicações do MST e a elevação do salário mínimo regional foram nesse sentido.
Mas é evidente que políticas reformistas como essas só podem ser efetivadas em um período de crescimento econômico, o que beneficiou o governo Requião. A crise econômica capitalista impõe limites muito severos à continuidade desse tipo de política. É o que já estamos vendo recentemente, com a dificuldade dos servidores públicos em conseguir negociações mais favoráveis de recomposição salarial.
As próximas eleições no estado estarão definitivamente marcadas por esse cenário de crise. A Bosch demitiu, no último dia 18, 900 trabalhadores, e colocou outros 3 mil funcionários em licença remunerada. E tentou impor ao sindicato da categoria um acordo de redução de salário sem garantia de emprego. É um exemplo claro do que a classe trabalhadora deve enfrentar. E, no entanto, para assegurar apoio à candidatura outorgada de Dilma Rousseff à Presidência e garantir a coalizão com setores da burguesia, parte da direção estadual do PT costura acordos com partidos e representantes das elites locais, inimigos históricos da classe trabalhadora. A crise exige outra postura. Exige uma candidatura própria do PT, de unidade com os partidos e movimentos vinculados à classe trabalhadora, com um programa radical, socialista, de enfrentamento da crise. Programas reformistas, de aproximação do ideário burguês, tendem a afastar o PT das suas bases, que não o diferenciam mais dos partidos tradicionais. A votação pouco expressiva da candidata Gleisi Hoffmann, na eleição municipal de Curitiba, foi exemplar nesse sentido.
A CUT estadual deve reforçar sua presença nas lutas populares e na CMS; na luta pela Reforma Agrária no estado; participar e estimular campanhas como a da luta contra os pedágios, de forma independente; exigir o atendimento das reivindicações do funcionalismo público; organizar a classe trabalhadora contra qualquer ameaça de retirada de direitos ou de redução salarial, superando práticas convencionais, viciadas, burocráticas de ação sindical.

Perspectivas: a CUT e a questão sindical

A Corrente Sindical da Esquerda Marxista, considera que a CUT acertou em não sentar à mesa com empresários, governo e outras centrais sindicais para negociar redução de salários e direitos no início da crise. Mas ainda é insuficiente. De fato, só a mobilização de massa da classe trabalhadora pode defender, dos ataques promovidos pela crise econômica, os direitos e as condições de vida duramente conquistadas nos últimos tempos, pressionar pela ruptura do governo com classe capitalista e avançar em medidas em direção a construção de uma sociedade socialista e verdadeiramente democrática. O aprofundamento da crise não descarta do horizonte a organização de uma greve geral. A CUT deve estar preparada para esses desafios, e honrar sua história classista e de luta, de construção pela base e de prática militante. Nesse sentido, a CUT deve resistir aos ataques que tem sofrido, com a política de cooptação do movimento sindical adotada pelo governo federal, que quer impor, em troca do reconhecimento das centrais, a generalização do imposto sindical – ou da sua outra forma, a taxa negocial – e arrastar a entidade para um pacto social, através d participação da sua direção em conselhos tripartites com governo e empresários. Esta política tem levado à divisão do movimento dos trabalhadores, que é respaldada pelas posturas em parte “esquerdistas”, em parte oportunistas, de criação do Conlutas, da CTB e da Intersindical. Mas essas divisões tendem a continuar, principalmente se a CUT for incapaz de mobilizar e unificar a classe trabalhadora brasileira em defesa dos seus interesses.