quarta-feira, 26 de março de 2008

Dois passos para trás...

A CNTE e o recuo no Piso Salarial Nacional

14 de março de 2008. Nesse dia, marchavam nas ruas de Curitiba cerca de mil trabalhador@s da Educação, atendendo à convocação da CNTE (Confederação Nacional de Trabalhadores em Educação), entidade que congrega sindicatos de funcionári@s e professor@s em todo país. A mobilização também incluia debates nas escolas. Em outros estados brasileiros aconteciam atividades semelhantes, todas exigindo a aprovação do Piso Salarial Profissional Nacional para a categoria. E vimos alguns dirigentes dos sindicatos locais (APP-Sindicato e SISMMAC) explicarem que o projeto defendido previa um salário base de R$ 950,00, para 40 horas semanais e 30% de hora atividade.
Vamos voltar um pouco no tempo. Estamos agora no dia 25 de abril do ano passado. Uma marcha parecida, também chamada pela CNTE, frequentava as mesmas ruas, mas com diferenças substanciais: eram mais de quatro mil trabalhador@s em Educação, defendendo outro projeto de Piso Salarial. A CNTE exigia na época R$ 1050,00 para professor@s com nível médio (o antigo magistério) e R$ 1570,00 para os de nível superior, com uma carga horária de 30 horas semanais.
Em parte, o número menor de marchantes em 2008 pode ser explicado pelo encaminhamento da direção da APP-Sindicato, que chamou sob sua responsabilidade uma mobilização (sem fechamento das escolas) - e não uma paralisação (com fechamento das escolas) como no ano anterior, decidida em assembléia estadual pelo conjunto da categoria. É preciso dizer, a direção da APP apresentou uma justificativa para essa decisão. Uma paralisação em março, em defesa de uma pauta nacional, poderia precipitar demais a luta da categoria - que prepara a campanha salarial para a sua data base em maio, o que exige uma concentração maior de esforços no mês de abril. O argumento é razoável, mas a sua discussão não é o objeto desse artigo. Mesmo porque, a menor mobilização da categoria nesse ano parece não ter ocorrido só no Paraná, mas em todo país. O que aconteceu? E por que a CNTE recuou nas suas exigências quanto ao Piso, levando dirigentes sindicais a aceitarem o salário base de R$ 950,00 como uma “conquista”?

Um pouco de história

A luta por um Piso Salarial Nacional existe desde os tempos do Império. A 1ª lei a tratar de um salário base para professor@s de todo o país data de 1827. A lei nunca foi implementada. Depois de mais de 160 anos de luta, o governo Itamar Franco, em 1993, dá novo alento à idéia, fechando um Acordo Nacional com a categoria, que previa um Piso de R$ 300,00. Mas governo FHC rompeu com o acordo. E a luta continuou.
No início de 2007, Fernando Haddad, ministro da Educação do governo Lula, apresentou um projeto de lei (o PL 619) para instituir um Piso Salarial de R$ 850,00. Ganhou como resposta a crítica da CNTE. A Confederação lembrou ao ministro que o Piso Salarial não é só salário, mas também jornada e formação; a Confederação apresentou sua proposta de piso a partir do valor do antigo Acordo Nacional, somado agora à inflação, e chegou ao valor de R$ 1050,00 para @ profess@r com magistério; com o objetivo de estimular a formação continuada, defendeu um salário maior para quem tem formação superior (R$ 1570,00); propôs uma jornada de 30 horas semanais; e convocou a categoria a ocupar as ruas. Foi por essa proposta que marchamos naquele 25 de abril de 2007.
Em outubro, ainda sob efeito dessa primeira mobilização nacional, a Comissão de Educação da Câmara de Deputados cedeu um pouco às pressões – elevou o projeto de Piso para R$ 950,00, incluiu 30% de hora atividade e sinalizou para uma jornada de no máximo 40 horas semanais.
Apesar do relativo sucesso da mobilização, a CNTE mudou de tática. Substitui a batalha massiva nas ruas pelo pequeno assédio aos parlamentares. Entre outubro de 2007 e março de 2008, o projeto tramitou de comissão em comissão, e pouco ou nada mudou (pelo contrário, já temos baixas pelo caminho, como veremos à frente).

Governo em disputa?

Apesar da possibilidade de avançar mais, as direções sindicais e da CNTE preferiram garantir um acordo ao invés de fortalecer as mobilizações. E se apressam por fazer aprovar o Piso de R$ 950,00, deixando de lado as reivindicações da própria Confederação. Esperam inclusive que Lula cumpra a promessa feita em janeiro desse ano, de editar uma medida provisória caso o PL não seja aprovado até maio pelos parlamentares. Daí a campanha de 14 de março recuar em relação à 2007: menos trabalhador@s na rua, por um Piso também menor...
A forma com que muitos dirigentes sindicais caracterizam o atual governo ajuda a entender o recuo orquestrado. Para eles o governo Lula está em disputa. Antes de confrontar o governo com o atendimento de reivindicações históricas, o “campo popular” deve acumular forças e conquistar posições (inclusive no aparelho de Estado) para então se lançar em sua luta contra os interesses encastelados do Capital. Para essa espécie de gênios estrategistas, o governo está em disputa, mas não nas ruas. Afinal, mobilizações de massa podem levar à insatisfação e ao crescimento da Direita. Estão errados. Esse não é um governo em disputa (se é que já existiu essa aberração em algum lugar, que não na cabeça de seus inventores). Esse é um Governo de Coalizão – onde reconhecidos representantes da classe trabalhadora fazem um pacto com setores da burguesia para garantir a manutenção da ordem capitalista. Pequenas concessões às “reivindicações populares” são permitidas, desde que não firam substancialmente os interesses estabelecidos. E as direções sindicais são arrastadas como fiadoras do negócio. Exemplo disso foi o Congresso da CNTE desse ano, onde diversas correntes sindicais estavam mais preocupadas em formar uma linha de defesa do governo Lula do que encaminhar as reivindicações da categoria (para mais detalhes, ler a matéria Congresso da CNTE: Balanço Político, nesse blog).

A Arte da Guerra

Esses nossos estrategistas do “Governo em Disputa” pretendem inovar na arte da guerra. Querem fazer crer que é possível ganhar posições do inimigo fazendo recuar seu próprio exército; que, sem demonstração de força, seus adversários estarão mais dispostos a fazer concessões. Não é o caso aqui de dar um passo para trás para avançar dois mais à frente. E sim de recuar ao sinal de qualquer acordo. Não se trata de lutar, mas fingir que se luta. Só que corremos o risco de nossa manobra expor nosso flanco, e sob uma retomada do fogo inimigo, sermos obrigados a recuar mais e mais. Vejamos.
O atual PL não atende muitas das reivindicações da CNTE. Primeiro, pelo valor do Piso; segundo, por não estimular a formação continuada, já que não distingue @s professor@s com nível médio dos que têm nível superior; terceiro, a implantação do Piso é escalonada, devendo alcançar o valor mínimo somente em 2010; quarto, e talvez o mais importante: @s funcionári@s de escola não estão incluíd@s no atual PL.
Para completar, a falta de mobilização deste ano já está nos custando caro. No dia 19/03 (5 dias após a mobilização do dia 14!), o PL passou pela Comissão de Finanças. Lá, um artigo que estendia aos aposentados e pensionistas o benefício do Piso Salarial Nacional foi suprimido pelo relator. O que deixa em suspenso o princípio da paridade entre quem está ou não na ‘ativa’. Nessa mesma comissão, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) já mostrou suas garras, fazendo uma forte pressão para retirar do PL os 30% de hora atividade. Encaminhado o projeto para a votação no Senado ou na Câmara, é evidente que os prefeitos irão mobilizar seus representantes no parlamento para fazer saltar essa reivindicação, sem peso na consciência por desrespeitar qualquer ‘acordo’ previamente estabelecido. A mesma pressão que farão sobre o gabinete da previdência, caso o governo Lula decida resolver tudo por decreto. As guerras são assim. De recuo em recuo, o que seria uma conquista histórica para a categoria poderá virar seu verdugo. É o risco, já anunciado pela própria CNTE, do Piso virar Teto.
Precisamos abandonar com urgência essa posição desmobilizadora que diz que a aprovação do atual PL será uma conquista. Devemos retomar as reivindicações da CNTE e lutar pela proposta que a Confederação apresentou em 2007. E mais do que isso, retomar as mobilizações nacionais. Um bom passo por aqui seria exigir das direções da APP-Sindicato (da rede Estadual) e do SISMMAC (da rede municipal) que se pronunciem claramente sobre seu posicionamento no assunto. Afinal, não é papel de nenhum sindicato recuar frente ao governo. Qualquer que seja o governo.

sábado, 15 de março de 2008

Congresso da CNTE: Balanço Político

De 17 a 20 de janeiro, ocorreu em Brasília – DF o 30º Congresso da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), intitulado “Educação Pública: A diversidade que promove a igualdade”, contando com a participação de 1.890 delegados de diversas regiões do país.
O Congresso foi marcado por acordos de cúpula, organização burocrática dos espaços, privilegiando mesas e painéis expositivos que limitaram drasticamente a intervenção e o debate entre os delegados, além da intensa disputa artificial entre a maioria das teses, que no plenário se comportavam como torcidas organizadas. Deixando-se de lado o debate político qualificado e a organização dos trabalhadores em educação na luta pelas suas reivindicações.
Articulação Sindical (Articulação/ PT) e a Corrente Sindical Classista (CSC/ PCdoB), que recentemente rompeu com a CUT para formar sua própria central sindical (CTB), chegaram no Congresso acordados para formação de chapa comum, com a nítida intenção de blindar o governo Lula. Após o início do Congresso, abriram espaço para que outros setores Cutistas se integrassem à chapa, sendo endossado pela Corrente Socialista e Democrática (CSD/ DS), após ganharem a vice-presidência da entidade, e Articulação de Esquerda (AE). Lamentável a postura desses setores Cutistas que formam chapa com a CSC/ CTB, que divide a CUT, para priorizar acordo com quem apóia o governo Lula, em detrimento da defesa da Central Única dos Trabalhadores.
Do outro lado estava a chapa formada por Conlutas/ Intersindical que defendia a todo custo a desfiliação da CNTE da CUT, trabalho que essas correntes já realizam nos sindicatos de base que dirigem ou militam. Atitude que também reprovamos, por dividir os sindicatos e os trabalhadores. Além de outra chapa formada pela Corrente O Trabalho e independentes que chamou a unidade Cutista e a luta unificada pelo piso salarial nacional da categoria, a qual nos incorporarmos por existir acordo com relação à política defendida.

Renato Pizzatto Vivan
Delegado eleito pela base do SISMMAC ao 30º Congresso da CNTE